Noites brancas
Começar no mundo dos clássicos da literatura e mais especificamente no mundo de Dostoiévski por Noites Brancas é uma experiencia gratificante e maravilhosa. Retornar a 1800 e mergulhar em uma mente romantista e sonhadora nos faz refletir sobre a humilhação pessoal que a paixão em excesso pode transmitir e que muitas vezes só é vista pelo lado de fora da bolha do que nossa própria mente nos quer mostrar. Todo sentimento em excesso é degradante e influencia mesmo que indiretamente nosso futuro como pessoas e nosso amadurecimento, nossas decisões e nossa maneira de expressar.
Nesse caso nossa maneira de nos expressarmos é um foco marcante, e o livro nos mostra que pode mudar drasticamente de acordo com o quanto demonstramos nossos sentimentos para alguém e permitimos nos abrir para certas pessoas, o que de todo não é errado pois faz parte da nossa evolução pessoal, mas que o sentimento de traição vem junto com a irresponsabilidade que temos com nós mesmos, nos entregando para qualquer ponto de afeto e nos rendendo ao conforto do próximo e mergulhando na ignorância de entregar nossa pureza para qualquer um.
No fim, a culpa dos nossos arrependimentos sobre alguém é absolutamente nossa, as expectativas que temos com os outros e que colocamos em determinadas situações não devem cair sobre as pessoas vitimas dos nossos sentimentos, pois elas não tem culpa daquilo que queremos, imaginamos sobre elas e das nossas fantasias irrealistas.
Uma discussão pertinente sobre o livro é em relação a suposta irresponsabilidade afetiva vindo da musa do nosso protagonista sonhador, a Nastenka, que pra mim não tem fundamento a partir de que as intenções da personagem foram claras desde o principio da obra, e novamente e infelizmente a culpa da situação recai para o sonhador, por que naquele ponto da história a imagem amorosa que o mesmo cria sobre a personagem é baseada em suas próprias expectativas e sua cegueira de paixão, mas que ainda sim o mesmo tem noção e assume essa responsabilidade mesmo sem falar sobre ela indiretamente. O personagem sabe a situação em que está se metendo, e se disponibiliza a ajudar a garota mesmo que isso irá feri-lo posteriormente.
O fim novamente nos abre brechas pra comentar sobre outro assunto necessário, que é a maneira como lidamos com as situações da vida. Vemos que mesmo com a triste situação final em que o sonhador se encontra, ele escolhe ver gratidão em cima da mágoa que o atinge, e isso pra mim é uma prova de que tudo nas nossas vidas é referente a como reagimos as situações que nos são postas, o sonhador poderia tranquilamente se lamentar para sempre, mas isso não mudaria de nada os acontecimentos, por que além de não podermos mudar o futuro, se prender ao passado não deveria sequer ser uma escolha. O protagonista não tem controle sobre a situação, e isso acontece em vários momentos com todos. Se nós não nos amargurarmos por situações fora do nosso controle, iriamos não só viver uma vida mais leve como também iriamos ver tudo que tiramos de aprendizado da situação e encontrar beleza nos devidos momentos.
Pra finalizar, é impressionante como podemos nos identificar com uma obra russa do século 19 e ver sua modernidade escrita por um autor tão maravilhoso e criativo. Nós temos um conjunto com inicio, meio e fim, um contexto melancólico e atraente, plot twist e tomada de dor pelos personagens em um pequeno livro de 136 páginas. São poucos os escritores tão completos e complexos e são muitos os que deveriam ler esta obra. Recomendarei esse belo livro para toda uma vida, e o carregarei para sempre em meu coração devoto de paixão por literatura.